Vento de Proa e Sustentação: Por Que Decolar Contra o Vento é Mais Seguro
- Adauto Costa
- 4 de out.
- 5 min de leitura
A sustentação de uma asa depende da velocidade do vento relativo sobre ela (velocidade do ar em relação à aeronave) e cresce com o quadrado dessa velocidade. Em termos físicos, o avião levanta voo quando a sustentação (força para cima) excede o peso (L > W):
onde:
L: sustentação (força para cima). Unidade: newton (N).
ρ: densidade do ar. Unidade: kg/m³ (~1,2 kg/m³ ao nível do mar).
S: área de asa (área alar “planta”). Unidade: m².
CL: coeficiente de sustentação (adimensional). Depende do ângulo de ataque, flap etc.
Vr: velocidade relativa do ar sobre a asa (airspeed). Unidade: m/s.
W: peso da aeronave.
Em voo, o vento de proa (que sopra contra o nariz da aeronave) aumenta a velocidade do ar sobre as asas, elevando a sustentação mesmo com menor velocidade em relação ao solo. Já o vento de cauda sopra na mesma direção do voo, reduzindo a sustentação e exigindo maior distância para decolagem e pouso. O vento de través, por sua vez, atua lateralmente sobre a fuselagem, exigindo maior controle do piloto, especialmente durante as fases críticas de pouso e decolagem.
Como o Vento de Proa afeta a Aeronave
Vimos que Vr representa a velocidade do ar relativa à asa. Quando há vento de proa, Vr=V+Va, sendo V a velocidade da aeronave em relação ao solo (ground speed) e Va a velocidade do ar (vento).
Durante a decolagem, o vento de proa aumenta a velocidade relativa do ar sobre as asas, permitindo que a aeronave gere sustentação suficiente com menor velocidade no solo, o que reduz a distância necessária para decolar. Já no pouso, o mesmo vento de proa possibilita que a aeronave atinja a velocidade de sustentação em uma menor extensão de pista e com menor velocidade ao toque, tornando a operação mais segura.


Algumas Recomendações Conforme Normas Oficiais Vigentes
As normas aeronáuticas brasileiras, emitidas por órgãos como o DECEA e a ANAC, estabelecem diretrizes essenciais para garantir a segurança nas operações de pouso e decolagem. Entre elas, destacam-se recomendações sobre o comportamento das aeronaves em relação à direção e intensidade do vento, definindo limites operacionais e boas práticas a serem observadas por operadores e pilotos. A seguir, são apresentadas algumas dessas recomendações conforme as normas oficiais vigentes.
A norma ICA 100-37, em seu item 6.5.2, estabelece que:
“Normalmente, a aeronave pousará ou decolará contra o vento, a menos que as condições de segurança operacional, a configuração da pista, as condições meteorológicas e a disponibilidade de procedimentos de aproximação por instrumentos ou as condições de tráfego determinarem que é preferível uma direção diferente.”
A ANAC, em publicação oficial sobre Rajadas de Vento, reforça:
“O vento ideal para pouso e decolagem é sempre o vento contrário (vento de proa). Nunca o vento de cauda.”
A Instrução Suplementar nº 121-020, Revisão B, no item C4.9.3, complementa:
“O operador deve estabelecer limites de operação com vento de cauda e com vento de través, em conformidade com os manuais de cada modelo de aeronave. Ao estabelecer esses limites, devem ser desenvolvidas orientações aos pilotos sobre como identificar as condições de vento no aeródromo e seu entorno, além das informações fornecidas pela torre de controle. Para pista molhada, é proibida a operação com vento de cauda reportado superior a 6 KT e/ou vento de través reportado maior que o valor do limite previsto no AOM, reduzido de 5 KT.”
Acidentes Causados por Vento de Cauda
O relatório preliminar do NTSB concluiu que fortes ventos de cauda e de través contribuíram decisivamente para o acidente aéreo que matou o legislador do Condado de Montgomery, Daniel Wilson, em Block Island, Rhode Island. A aeronave, um Piper Cherokee, pousou já além da metade da pista sob condições de vento desfavoráveis. Durante a frenagem, uma rajada levantou a asa direita, e o piloto, sem pista suficiente, não conseguiu arremeter.

O avião saiu da pista e colidiu com árvores. O relatório também apontou falha de comunicação: o piloto permaneceu por um tempo considerável transmitindo em uma frequência errada, mesmo após ser alertado. O acidente ocorreu na terceira tentativa de pouso, depois de duas arremetidas. No toque, a velocidade era de 83 nós, reduzindo para cerca de 73 nós quando o avião deixou a pista. Daniel Wilson, de 77 anos, morreu no local; o piloto e outro passageiro ficaram gravemente feridos. A aeronave pertencia a um clube de voo de Albany e o grupo viajava para um almoço em Block Island.
Acidente com monomotor
Em 4 de julho de 2017, uma aeronave Piper PA-28, um monomotor com três pessoas a bordo (um piloto e dois passageiros), parou em uma área gramada depois de sair da pista do aeroporto.
O avião decolou do Aeródromo Campo de Marte (SBMT), em São Paulo, com destino a Ubatuba por volta das 19h30. Após o pouso, a aeronave ultrapassou o limite da pista e acabou parando no gramado.
Segundo relatório do Cenipa, o Piper teve danos substanciais, mas todos os ocupantes saíram ilesos. O caso foi registrado como acidente.
De acordo com o relatório final do órgão, a execução de um pouso longo, combinada com vento de cauda no momento, resultou na incapacidade de parar a aeronave dentro dos limites da pista.
O Cenipa concluiu também que a escolha inadequada da cabeceira (27, no caso), associada à pouca experiência do piloto e à falta de familiaridade com o aeródromo, foram fatores determinantes para o acidente.
Consequências Operacionais e Lições de Segurança Associadas ao Vento
A sustentação de uma aeronave depende diretamente da velocidade relativa do ar sobre as asas, e o vento exerce papel decisivo nesse equilíbrio. O vento de proa aumenta a sustentação e reduz as distâncias necessárias para pouso e decolagem, enquanto o vento de cauda tem efeito oposto, elevando os riscos operacionais.
Por reconhecer esses impactos diretos na performance e na segurança das operações, as normas do DECEA e da ANAC reforçam a importância de operar preferencialmente contra o vento e de respeitar limites para ventos de cauda e de través, especialmente em pistas molhadas.

A aplicação prática dessas normas é confirmada pela experiência operacional, já que, pelos exemplos citados de acidentes investigados pelo NTSB (Estados Unidos) e pelo CENIPA (Brasil) demonstram que o descumprimento dessas recomendações (como pousos longos com vento de cauda ou escolha inadequada de cabeceira) está entre as causas mais recorrentes de excursões de pista e perda de controle durante o pouso.
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